Nas expressões de adoração que utilizamos em nossos cultos coletivos para, como igreja, exaltarmos ao nosso Deus, encontramos a possível exteriorização dos nossos sentimentos para com a pessoa de Deus, assim como do nosso entendimento de quem Ele realmente é.
Quando introduzo a palavra "possível", é
porque pode-se praticar uma expressão de adoração a Deus quando o sentimento
real do coração não é este. Aliás, isso foi muito combatido pelo Senhor
Jesus em relação aos escribas e fariseus, chamando-os de hipócritas. Pode-se
também praticar qualquer das expressões sem o entendimento devido do seu
significado, a exemplo daqueles que sofrem do efeito ‘macaco-papagaio', ou
seja, gesticulam meramente imitando e falam meramente repetindo.
Na passagem mais preciosa do novo testamento
sobre adoração, Jesus nos ensina o resumo dos elementos que devem estar
presentes na nossa adoração cotidiana: “em espírito e em verdade”. Tentando
traduzir melhor, sentimento e entendimento. É interessante notar também que
tal ensino não acontece na sinagoga e sim à beira de um poço, e que, quem
está por lá não são os “do clero” e sim uma mulher da escória da sociedade
da época, trazendo-nos a idéia de que o ensino do capítulo 4 do evangelho de
João tem a ver com algo que é para o dia-a-dia, o cotidiano das pessoas
comuns, inclusive o clero.
E é essa adoração em tudo o que fazemos, seja
comer, beber ou qualquer outro fazer que irá inspirar e motivar a nossa
adoração coletiva, fruto de um conjunto de experiências pessoais vividas com
o Senhor Jesus e de um conhecimento cada vez mais racional de quem Ele é.
Tudo isso deve estar fazendo parte não de um equilíbrio, que para acontecer
exige a retirada de partes, mas de uma temperança, que aglutina todos os
temperos em uma só panela.
Muitas das expressões de adoração estão
mencionadas na Bíblia, tais como, o cantar, o acompanhamento de instrumentos
musicais, o erguer das mãos, gritos de júbilo, o ofertar, o aplaudir, a
oração, o prostrar-se, o dançar. Isso não significa que todas tenham de
acontecer em um mesmo momento. Também não significa que a exemplo de uma
receita de bolo onde a falta de um ingrediente afeta o resultado final,
algumas das expressões não possam deixar de ser utilizadas no culto.
Há também a questão cultural, que varia no
tempo e no espaço. No nosso próprio contexto de Brasil há muito pouco tempo
a dança, assim como alguns instrumentos musicais não eram aceitos nos
momentos de culto e hoje o são, porém, ainda há os casos de comunidades
possuírem um contexto cultural diferenciado, o que deve ser respeitado.
Há aquelas expressões de adoração que apesar
de não mencionadas na Bíblia, são aceitas em determinados contextos como
possível exteriorização de um sentimento genuíno. É o caso, por exemplo, do
assovio, utilizado normalmente juntamente com aplausos em momentos de
euforia na celebração. É claro que qualquer das expressões de adoração,
dentre as mencionadas na Bíblia ou não, têm que ser exercitadas com ordem e
decência. Mas os nossos conceitos sobre ordem e decência também podem
divergir, e aí? Tudo isso pode gerar muita confusão e divisão se não
encararmos como pertinente às nossas culturas, que, repito, variam no tempo
e no espaço, seja de país para país, ou de comunidade para comunidade.
Mas será que assovios podem ser considerados
como expressões de adoração e aceitos em nossos cultos? Será que pulos ao
ritmo das músicas o são? É certo que cada um de nós possui uma história
singular, equações de características temperamentais diversas, preferências
e reações as mais variadas, inclusive em relação ao momento de vida.
Glória a Deus por isso! É como uma torcida de
futebol, todos torcem pelo mesmo time, mas reagem de formas diferenciadas ao
externar a sua alegria no momento do gol. O nosso Criador, além de
extremamente criativo, é aquele que conhece os corações, os sentimentos e as
motivações.
Creio que tais questões fazem parte daquelas
discutíveis entre os cristãos e mencionadas pelo apóstolo Paulo em Romanos
14, na época se comer carne sacrificada a ídolos ou não, se deviam guardar
dias especiais para adorar a Deus ou não, hoje, se devemos expressar
adoração de tal forma ou não, dentre tantas outras discussões. Há bem pouco
tempo discutíamos sobre o uso da bateria nos ‘templos', ou de aplausos em
certas reuniões, ou sobre o reconhecimento da dança como expressão de
adoração. E talvez tais discussões ainda estejam bem presentes no nosso
meio.
O fato é que continuamos discutindo e,
possivelmente, em nome de uma autêntica expressão de adoração, deixando de
adorar a Deus com a maior das expressões que pode existir, o amor. Quantas
vezes ao longo da história as discussões tornaram-se mais importantes do que
os seus próprios debatedores, gerando pontos de vista firmados, porém
relacionamentos quebrados.
Pensar em expressar adoração a Deus não pode
apenas envolver uma verticalidade egoísta e sim o acréscimo de um sentido
horizontal na direção do irmão. Paulo inicia o capítulo 14 de Romanos
orientando-nos a acolher o irmão, mesmo não tendo ele a nossa opinião, e
conclui o assunto no capítulo 15 dizendo: “Portanto, aceitem uns aos outros
para a glória de Deus, assim como Cristo aceitou vocês...”
Se continuarmos o texto veremos que o objetivo
final era, a exemplo de Cristo, que se tornou servo dos judeus, “para fazer
com que os não judeus louvassem a Deus pela sua bondade”, que partamos em
direção do nosso irmão que pensa igual ou diferente seja qual for a
temática, inclusive a forma de louvar, com o intuito de que a grandeza de
Deus seja vista, ou seja, para a glória de Deus.
Quando vislumbramos a grandeza de Deus não há
como não adorá-Lo. Assim acontece quando contemplamos os céus, que sem
palavras exibe Sua grandeza. Assim pode acontecer conosco se, além de
expressarmos louvor a Deus talvez cantando, tocando, erguendo as mãos,
gritando, ofertando, aplaudindo, orando, prostrando, dançando, ou mesmo
pulando ou assoviando, simplesmente amarmos. Celso, filósofo romano
anticristão do segundo século, teve de admitir relutantemente: “Veja como se
amam esses cristãos”.
Além de um testemunho para os que não conhecem
a Cristo, amar implica numa decisão. Assim como no relacionamento entre
marido e mulher podemos decidir edificar ou manipular, o mesmo acontece em
relação ao nosso irmão. A Bíblia nos ensina que os dons existem para a
edificação da igreja. Mas quem é a igreja, senão o nosso irmão? E servir à
igreja é abençoar ao irmão, mais do que a instituições, ou mais do que a nós
mesmos, fazendo com que ele cresça inclusive na fé, edificando-o.
Lembremo-nos que pela existência do nosso
querido ou não tão querido irmão está também a nossa possibilidade de
exercer de fato uma verdadeira adoração. E já que dentre todos os seres
criados pelo próprio Deus para a Sua adoração, o ser humano é o único a quem
foi dada a condição de fazê-lo com intencionalidade, podemos decidir, tanto
eu quanto você, ter como meta expressar uma genuína adoração a Deus,
decidindo amar ao nosso irmão. Como podemos amar a Deus a quem não vemos, se
não amamos àquele a quem vemos? Da mesma forma, como celebrar a quem não
vemos se...